Há um mês eu estaria tentando cochilar em uma cadeira desconfortável, tentando apoiar minha cabeça e pés nas bagagens ao meu redor, estava no aeroporto de Recife, estava voltando de algo que foi para mim mais que uma viagem, um encontro.
Viajei de ônibus por dois dias e meio, na bolsa o necessário, roupa, livro, um caderno de notas e muita música, mesmo assim, confesso que mal me aguentava mais na poltrona quando soube que sofreríamos um atraso de seis horas por causa de um acidente na estrada. Fora o percalço do caminho, não tenho muito que reclamar, na janela paisagem deslumbrante, dentro do ônibus conversa boa e muita história, ouvindo The Freewheelin, lendo Into The Wild e a estrada se desenhando...
E cheguei em Campina Grande, na plataforma tia Alaide (irmã do meu avô), seu esposo tio Dogival e Josimar (sobrinho de consideração de meu avô), nos reconhecemos com facilidade, parecia que nos conhecíamos a tantos anos... Aqueles dos quais ouvi toda uma vida estavam agora em minha frente me abraçando, me pegando as mãos, dizendo do prazer de me receber na casa deles, tudo o que meu avô falava com lembrança e lágrimas nos olhos eram muito mais.
Alvinho, lugar onde seu Palmeira nasceu é coisa muito bonita, se configura principalmente com criação de gado e plantações de maniva, milho e feijão, o chão curiosamente é de areia, choveram quase todos os dias em que lá eu estive. Foi tia Laide quem me levou para conhecer a todos que moram por lá, fomos de moto para quase todos esses lugares, uma bizinha e muita aventura pelas trilhazinhas em meio as plantações, imagens que registrei na mente e que me enchem de saudades, da família conheci mais de quarenta pessoas, uma primaiada linda que só conhecendo, fui conquistada por tudo e por todos de Alvinho. Lá conheci pessoas que meu avô estima muito como seu João Laurentino e Dona Branca, um casal raro, seu João tem seus 95 anos, dona branca 84 estão casados a 67 anos, mais lúcidos que muita gente nova que eu conheço por aí carinhosos sem limites, lembram os personagens do documentário O fim e o principio que eu assisti pela primeira vez a uns três anos atrás.
E lá fui onde eu conheci mais um pouco da história deste homem que é mais que meu avô, um paraibano da gema, um lutador como tantos Severinos por aí, meu pai, Seu José jacinto Palmeira. Este José nascido em Alvinho em outubro de 1939 foi o primeiro filho do segundo casamento entre Joaquim Palmeira da Costa (mais conhecido por Joaquim Jacinto Palmeira) com Maria Siverina da Conceição, a relação durou o tempo da concepção de dois filhos, depois José foi entregue a um casal de irmãos para por eles ser criado em um lugar de confiança onde Joaquim pode observar de perto o crescimento do filho. Em idade de “abestelhação” como diria Tia Laide, por algum desmotivo, com medo de seu pai, José pegou estrada sem olhar para trás, cortou o Brasil de carona, foi candango e chegou a São Paulo. Amigo de estrada, Luiz Gonzaga cearense se ofereceu para ser tutor de José para que o rapaz pudesse tirar a carteira de identidade e arranjar alguma ocupação, então resolveu-se que se chamaria José Jacinto Palmeira, inventou o nome de seus avos e assim foi, construiu sua vida em São Paulo, conheceu Maria Paixão Miranda por quem se apaixonou “uma baixinha de negros cabelos longos que vinham até a cintura”, com ela casou-se e teve seus três filhos, Cleide Miranda Palmeira, primeira filha do casal, em seu primeiro casamento também teve seus três filhos do qual eu sou a caçula, assim esta história chega a mim que talvez devesse me chamar Renata da Costa Bencsik se meu avô soubesse o verdadeiro nome de seu pai. Mas, antes que está história chegasse até mim, um dia no ano de 1978, José, que na época trabalhava em uma companhia de gás, observou a placa do caminhão que estava parado logo a sua frente e que trazia a inscrição Puxinanã – PB, desceu do carro e foi falar com o motorista, perguntou se o rapaz conhecia o lugar, se conhecia Alvinho e o povo que por lá morava, seu Joaquim Jacinto, sua família, sim o rapaz confirmou, prometeu entregar o endereço da família a José, assim um laço foi reatado e José 30 anos depois de ter tomado à estrada pode reencontrar sua família, conhecê-los, seu pai Joaquim havia morrido a três anos em 1975 que olhando a plantação de milho ainda verde disse que daquele ele não haveria de comer. José é a figura de seu pai esculpido em Carrara e quando em 78 desembarcou na plataforma de Campina Grande foi facilmente reconhecido, não consigo imaginar o que foi aquele dia na plataforma. Meu avô conquistou a todos, é lembrado com sorrisos, risadas e lágrimas saudosas, já não vai a Campina Grande há dez anos...
Está viagem foi muito mais que eu imaginava, muito mais do que eu podia esperar, as pessoas que conheci, tudo o que de mais simples eu vi passaram a compor agora os meus dias, novos objetivos traçados, desejos resignificados e tudo o que mais eu possa aqui escrever não vai dar conta do que foram aqueles dias para mim, só cabe acrescentar a minha vontade de lá voltar só que desta vez acompanhada de seu Palmeira, quem sabe...
http://www.youtube.com/watch?v=P1bdx65PVH0
R.